segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Liberdade aos presos políticos da Norte Energia e do Estado do Pará

Ernesto, Elizeu, Matheus, Odivaldo e Raimundo. Estes são os nomes dos cinco operários presos na Delegacia de Polícia de Altamira há mais um mês. Eles são acusados de “incêndio, formação de quadrilha e danos ao patrimônio”, mas, segundo a advogada que acompanha o caso “as provas contidas nos autos não provam nenhuma das acusações feitas aos operários”. 
Estão presos desde o dia 12/novembro, após os incidentes ocorridos nos canteiros de obras de Belo Monte que culminaram com alojamentos queimados, cerca de 5.000 operários evacuados da cidade, centenas de demitidos e a paralisação das obras de Belo Monte por uma semana. 
Inclusive, o laudo oficial do Corpo de Bombeiros Militar do Pará, apresentado no dia 21/novembro, foi inconclusivo sobre se o incêndio foi ou não criminoso. A perícia feita pelos bombeiros identificou que “não havia fiações elétricas, material de combustão espontânea ou vestígios de agentes aceleradores (de fogo), nem indícios de fenômenos termoelétricos como sobrecargas ou curtos circuitos e tampouco descargas atmosféricas (raios)” no local onde se originou o incêndio. O laudo apontou que, devido ao alto grau de destruição, todos os vestígios que pudessem revelar a causa do incêndio foram destruídos pelo fogo. 
Ora, como são mantidos presos, acusados de provocar o incêndio, se o laudo oficial da perícia do Corpo de Bombeiros, a quem compete tal investigação, concluiu não ser possível afirmar se o incêndio foi criminoso? 
No processo existem fotografias, nas quais não aparece nenhum dos acusados. E o depoimento de dois funcionários que ocupam cargos de chefias no Consórcio Construtor Belo Monte – CCBM, conjunto de empreiteiras contratadas pela Norte Energia S/A – NESA para construírem a hidrelétrica. 
Mas, nos depoimentos desses funcionários, não há nenhuma prova contra os cinco operários. E mesmo assim, a SUSIPE, o Tribunal de Justiça e o Ministério Público do Estado mantem os trabalhadores encarcerados. 
E ainda há outros absurdos nessa estória: 
1) apesar da prisão ter sido feita no dia 12/11, o suposto “flagrante” foi convertido em prisão preventiva pela Juíza e encaminhado ao Ministério Público somente no dia 15/11, quando o Promotor de Justiça decidiu manter a prisão preventiva; 
2) o inquérito policial, sob nº. 0005039-79.2012.814.0005, foi concluído e encaminhado ao MPE somente no dia 07/12, sem provas do crime, 26 dias após a prisão; 
3) até a data de hoje, 18/12, quando já se completou mais de um mês, desde a prisão, o MPE ainda não se pronunciou, pois o mesmo Promotor de Justiça que atua em Altamira é responsável por atender as cidades vizinhas de Porto de Moz e Novo Repartimento, ficando em permanente deslocamento entre os municípios; 
4) o sistema informatizado do TJE-PA, em Altamira, esteve “fora do ar”, por mais de duas semanas, dificultando a simples tramitação de documentos no interior do Fórum e atrasando ainda mais o processo; 
5) após impetração de Habeas Corpus no dia 27/11, a Desembargadora relatora denegou a medida liminar em 12/12 e encaminhou os autos ao MP em 18/12. Provavelmente o mérito do HC não será julgado esse ano. Vale ressaltar que a Desembargadora utilizou, dentre outros, a informação do Juiz de Altamira, afirmando que os próprios funcionários do CCBM provocaram o incêndio no alojamento, contrariando o laudo oficial do Corpo de Bombeiros. 
6) há vários depoimentos de colegas dos acusados afirmando estarem junto a eles nos momentos de tensão nos alojamentos, havendo inclusive evidências que provam que dois dos acusados sequer estavam nos alojamentos na noite em que começaram os incêndios. 
Enquanto a “Justiça” brasileira mantem cinco trabalhadores presos, sem nenhuma prova de qualquer crime por eles cometido, no mesmo período de um mês, a “Justiça” concedeu por duas vezes a liberdade ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, já condenado por formação de quadrilha e tráfico de influência, mais ainda aguardando julgamento por tantos outros crimes. 
Portanto, observa-se com extrema lucidez que o caso dos operários presos em Altamira é um típico exemplo de prisão política, onde os acusados são distinguidos por sua condição social e pelo tipo de ação que os levaram ao cárcere. 
E no caso dos operários de Belo Monte, seu único “crime” foi ter participado de manifestações por melhores condições de salário e emprego. Mas, justamente esse tipo de “crime”, jamais será tolerado pelo Estado capitalista. 

Basta de criminalização aos movimentos sociais! 

Liberdade imediata ao presos políticos de Altamira! 

sábado, 22 de dezembro de 2012

Triplica número de trabalhadores escravizados no desmatamento

A Campanha Nacional da CPT de Combate ao Trabalho Escravo divulga os dados parciais de trabalho escravo no país, até 10 de dezembro de 2012, Dia Internacional dos Direitos Humanos. Segundo os números, foram 168 casos em todo o Brasil, envolvendo 3.110 trabalhadores, tendo sido resgatados 2.187.

A informação é do sítio da Comissão Pastoral da Terra - CPT.

Dos 168 casos registrados pela Campanha, 63 ou 37,5% foram encontrados na pecuária. Esses casos envolveram 663 trabalhadores, mais de 21% do total, tendo sido libertadas 473 pessoas. Mas a atividade que concentrou o maior número de pessoas libertadas foi a da produção do carvão vegetal, 523 libertados, 23,9% do total. Em 29 casos em que estavam envolvidos 535 trabalhadores.

Trabalho escravo X desmatamento
Na categoria desmatamento foram registrados 13 casos, dois a mais que no ano anterior, envolvendo 345 trabalhadores, dos quais 121 foram resgatados. Em 2011, o número de trabalhadores escravizados em atividade de desmatamento foi de 109, sendo 55 libertados.
No que chamamos de outras lavouras são as culturas agrícolas que não são cana de açúcar, foram registrados 28 casos. Em 2011 foram 37 os casos. Entretanto, o número de trabalhadores envolvidos passou de 507, em 2011, para 837, em 2012. Um aumento de cerca de 65%.

Região Norte concentra quase metade dos casos
A região onde mais se flagrou mão de obra escrava foi a região Norte do país, com 81 casos, praticamente metade do total. O estado do Pará lidera o ranking com 46 casos, envolvendo 1.182 trabalhadores. Destes, somente 473 foram libertados. Nos chama a atenção quando comparamos estes números com os de 2011.
Apesar de o número de casos em 2011 ter sido maior, 49, o número de trabalhadores envolvidos foi de 499 e o de libertados 242. O número de trabalhadores escravizados no estado nesse ano mais que triplicou.
Tocantins aparece em segundo lugar no ranking, com 20 casos, dois a menos que no ano anterior, e 335 trabalhadores envolvidos, quando em 2011 foram 256 trabalhadores.
Os dados também mostram crescimento no número de pessoas envolvidas. Em São Paulo, passou de 191, em 2011, para 246, em 2012; no Amazonas de 98, para 165; no Paraná, onde o número de trabalhadores envolvidos saltou de 19 para 100; Piauí que apresentou crescimento de 30 para 88; Bahia, de 162, para 173; Rio Grande do Sul de 32 para 59.

Amazônia Legal tem os maiores números de trabalho escravo no país
Fazendo o corte por região geoeconômica, constata-se que em 2012, cerca de 62% dos casos ocorreram nos estados da Amazônia Legal, envolvendo 1.950 trabalhadores, 62,7% do total, tendo sido resgatados 1.106, 50,6% do total.
De acordo com dados do registro do seguro desemprego do MTE, processados pela Campanha da CPT, entre os anos de 2003 e outubro de 2012, mais de 25% dos trabalhadores resgatados da escravidão no Brasil eram oriundos do estado do Maranhão. Além disso, a média de idade desses trabalhadores gira em torno de 32 anos. A Campanha destaca, ainda, que do total de trabalhadores resgatados da escravidão contemporânea, mais de 95% eram do sexo masculino e mais de 35% eram analfabetos.
Esses dados têm como fonte o trabalho da Campanha da CPT, Grupo Móvel do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego e Ministério Público do Trabalho (MPT). Vale ressaltar, ainda, que os números totais aqui analisados incluem casos em atividades extra agrícolas, como na extração mineral, construção civil, confecção e outros que não são acompanhados diretamente pela CPT. 23 dos casos apresentados nesta análise se referem a essas atividades, envolvendo 580 trabalhadores. Dos quais 526 foram resgatados, um quarto do total geral.

Do IHU

Lideranças Karitiana denunciam ação de madeireiros contra grupos indígenas isolados

A ação de madeireiros, latifundiários e os impactos hidrelétricos de usinas no rio Madeira tem ameaçado a vida de comunidades indígenas em situação de isolamento no território Karitiana

Três indígenas do povo Karitiana colhiam castanhas nas proximidades da aldeia quando se depararam com os isolados. Conforme relatos, era um grupo composto por cinco indígenas e não se sabe ao certo se o grupo é ainda maior. Os Karitiana temem que a área de perambulação dos isolados, longe das comunidades de indígenas já contatados, esteja sofrendo um processo de invação pela ação truculenta de madeireiros, expondo os isolados a ondas de violência e os pressionando para perto da aldeia Karitiana.
Em outras oportunidades, os Karitiana já tinham visto o grupo, bem como vestígios nos caminhos em que estão andando, o que justifica ainda mais a tese de que os isolados são empurrados – pela presença de invasores – para longe da área a qual tradicionalmente costumam viver.
Preocupados com a situação de risco a que estão submetidos os isolados, o presidente da Associação do Povo Karitiana (APK), Antenor Karitiana, comunicou o fato ao responsável pela Frente de Proteção aos Indígenas Isolados da região relatando a situação. O objetivo é de que medidas urgentes de proteção ao território dos isolados sejam tomadas.
Culturas milenares poderão desaparecer pela ação desastrosa de madeireiros e latifundiários, que por suas atividades põem sob risco de extinção povos indígenas isolados ou sem contato.

*informações divulgadas pela Regional de Rondônia do CIMI

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

MPF/MT denuncia 30 por extração ilegal de ouro no leito do Rio Teles Pires em terras indígenas




Nesta terça-feira, 18 de dezembro, o Ministério Público Federal em Mato Grosso (MPF/MT) enviou à Justiça Federal denúncia contra 30 pessoas indiciadas na Operação Eldorado, acusadas de participar de um esquema de exploração ilegal de ouro no leito do Rio Teles Pires, dentro de terras indígenas de Mato Grosso. As acusações são de crime ambiental, formação de quadrilha, usurpação de bens da União, operação ilegal de instituição financeira, receptação qualificada e corrupção passiva e ativa.
Conforme a denúncia do MPF, além de abranger a Terra Indígena Munduruku, a atividade de extração ilegal do ouro estendia-se da Cachoeira da Rasteira – localizada no Rio Teles Pires, dentro da Terra Indígena Kayabi, entre os municípios de Apiacás (MT) e Jacareacanga (PA) – até o Porto Ramal, que fica à margem esquerda do Rio Tapajós, no município de Maués (AM).
Divisão de tarefas – A quadrilha que explorava ouro ilegalmente tinha ramificações nos estados do Pará, Rondônia, Amazonas e São Paulo e dividia suas atividades a três grupos.
O primeiro grupo era composto por garimpeiros/proprietários de balsas responsáveis pela extração ilegal do ouro no Rio Teles Pires. A atuação ilegal consistia na operação de garimpagem através de dragas no leito do rio, destinando o ouro ilegal a postos de compra de ouro nos estados do Pará, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso.
Faziam parte do segundo núcleo os proprietários/responsáveis pelos postos de compra de ouro e funcionários, que atuavam como intermediários na venda do ouro e se utilizavam de permissão de lavra garimpeira (PLG) de cooperativas para legalizá-lo, internalizando no Sistema Financeiro Nacional.
Os integrantes do último núcleo eram pessoas responsáveis pela logística para o abastecimento das balsas e dos garimpeiros, por recrutar garimpeiros para a extração ilegal do minério, por controlar e executar despesas com pessoal e outros insumos. Também era atribuição desse grupo dar suporte à comercialização do ouro, dissimular a legalidade do negócio e regularizar as embarcações utilizadas nos crimes.
Atuação da quadrilha – Mediante a cooptação de algumas lideranças indígenas locais, os garimpeiros exploravam ilegalmente o ouro no Rio Teles Pires, dentro das terras indígenas, via balsas escariantes. O minério era transportado para os municípios de Itaituba (PA), Jacareacanga (PA), Porto Velho (RO), Alta Floresta (MT) e Apuí (AM) e comercializado em Postos de Compra de Ouro (PCO) ligados a grandes empresas Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs).
Os PCOs se utilizavam de permissão de lavra garimpeira de cooperativas para legalizar o ouro. Na sequência, a documentação fornecida pelas cooperativas de garimpeiros conferiam aparência de legalidade à origem do metal precioso, permitindo que as DTVMs promovessem a inserção do ouro de origem ilegal, já “esquentado” e na condição de ativo financeiro, no Sistema Financeiro Nacional.
Por fim, parte do dinheiro proveniente dos crimes era investido nos maquinários utilizados na extração, retroalimentando o esquema.
Pedidos e outras providências – Para que os envolvidos respondam pelo crimes, o MPF pede que a denúncia seja recebida e os acusados sejam julgados e condenados por crime ambiental, formação de quadrilha, usurpação de bens da União, operação ilegal de instituição financeira, receptação qualificada e corrupção passiva e ativa.
O MPF requereu ainda, em manifestação separada, a instauração de um inquérito contra as DTVMs envolvidas para apurar especificamente o crime de lavagem de dinheiro; e pediu o arquivamento contra duas lideranças indígenas por terem participado das irregularidades da organização sem intuito de lucro pessoal.
O inquérito tramita sob sigilo na Quinta Vara da Justiça Federal de Mato Grosso.

Fonte: Procuradoria da República em Mato Grosso

TAPAJÓS: Rio de ouro e soja

Muito além da discussão sobre as hidrelétricas, o Tapajós vive problemas relativos ao garimpo – clandestino ou oficial – e a expansão do agronegócio
Por Carlos Juliano Barros, da Pública

Porto fluvial da Cargill em Santarém (PA)
 (Foto: Fernanda Ligabue / Pública)
Ivo Lubrinna não se conforma com o fato de seu candidato à reeleição para a prefeitura de Itaituba – “mesmo com a máquina na mão” – ter perdido o pleito realizado em outubro passado. Dono de uma voz grave e de uma franqueza espantosa, ele sabe que os próximos anos serão bastante movimentados no município de 100 mil habitantes que cresceu às margens do rio Tapajós, no oeste do Pará.
Enquanto concede a entrevista, Lubrinna é vigiado silenciosamente pelo filho, que acaba de voltar à Amazônia depois de nove anos na capital da Inglaterra, onde comandava uma prestadora de serviços de limpeza. Como a crise europeia não dá sinais de trégua, ele acha que é possível ganhar até três vezes mais investindo em Itaituba.
Até o apagar das luzes de 2012, Lubrinna estará à frente da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Produção. Porém, mesmo antes de integrar a linha de frente do Executivo local, ele já era uma verdadeira lenda, um dos garimpeiros mais conhecidos no Tapajós por conta dos mais de 40 anos de ofício. Não à toa, Lubrinna é o presidente – “licenciado”, como ele faz questão de ressalvar – da Associação dos Mineradores de Ouro do Tapajós (AMOT), entidade que representa menos de 10% dos 50 mil garimpeiros da região.
Enquanto se afasta da carreira de homem público, Lubrinna já se prepara para encarar a missão de homem de negócios, agora com a ajuda do filho. Após concluir recentemente o licenciamento ambiental do único garimpo que afirma possuir, e que segundo ele encontrava-se parado por falta de regularização, vai retomar a procura do ouro.
“Eu fui irresponsável até o dia em que assumi o cargo na prefeitura. Era um contrassenso: como é que o secretário de Meio Ambiente, com um garimpo irregular, iria discutir com alguém?”, questiona. Agora, ele já não corre atrás apenas do valioso metal. Cogita também investir em terrenos para a instalação de empresas de logística e de maquinaria pesada que, num horizonte bastante próximo, devem chegar à região.
Lubrinna encarna de forma pitoresca o nebuloso futuro de Itaituba. Encravado no coração da Amazônia, o município é o epicentro de uma avalanche de grandes empreendimentos que ameaçam seriamente uma região de altíssima biodiversidade habitada por diversas comunidades tradicionais e comunidades indígenas Munduruku.
Quem toma um barco e navega pelos 850 quilômetros de águas esverdeadas do Tapajós, que rasga de cima a baixo o oeste do Pará, não raro se depara com botos e aves mergulhando, além de uma paisagem verde de tirar o fôlego, protegida por um mosaico composto por reservas florestais e terras indígenas.
Entretanto, um amplo leque de obras – que vão desde hidrelétricas, passando por rodovia, hidrovia, portos fluviais, até projetos de mineração – pode redesenhar em um curto espaço de tempo as feições desse que é, reconhecidamente, um dos mais belos rios da Amazônia.
Sem sombra de dúvida, o projeto com potencial de gerar os impactos sociais e ambientais mais preocupantes é o chamado Complexo Hidrelétrico do Tapajós, um conjunto com potencial para até sete usinas que podem gerar até 14 mil Megawatts (MW) – a mesma capacidade da faraônica usina binacional de Itaipu, erguida durante a ditadura militar na fronteira do Brasil com o Paraguai.
Os estudos de viabilidade conduzidos pela estatal Eletrobras para licenciamento de duas delas – Jatobá e São Luiz do Tapajós – já estão em andamento. Por enquanto, o custo para erguer as duas barragens é estimado em R$ 23 bilhões. E o governo federal não esconde a pressa: já no ano que vem espera licitar pelo menos a construção de São Luiz do Tapajós e prevê que as duas entrarão em operação até 2019.
A energia dessas novas hidrelétricas tem pelo menos um endereço certo: grandes projetos de exploração de minérios no Pará, como ouro e bauxita – a matéria-prima do alumínio. A companhia norteamericana Alcoa, por exemplo, iniciou há apenas três anos a operação da terceira maior jazida de bauxita do mundo no município de Juruti, no extremo oeste do Pará, e já tem planos de construir uma fábrica de beneficiamento – por enquanto, a empresa utiliza energia de origem termelétrica. Já a brasileira Votorantim está levantando uma indústria do mesmo tipo no município de Rondon do Pará. A norueguesa Hydro também tira bauxita no leste do estado.
No caso do ouro, só uma mineradora de médio porte, a canadense Eldorado Gold, tem um projeto concreto de investimento no Tapajós. Mas a própria AngloGold Ashanti, companhia sul-africana considerada uma das maiores empresas de extração de ouro no mundo, também tem requerimentos de pesquisa no oeste do Pará, região hoje tomada pelo garimpo manual – em sua esmagadora maioria, clandestino.
Além de ser considerada a última grande fronteira energética e mineral da Amazônia, a região banhada pelo rio Tapajós tem ainda outro considerável atrativo econômico: é um corredor estratégico para o escoamento da produção de soja colhida no Mato Grosso, o principal produtor de grãos do país. Até 2014, o governo federal pretende gastar R$ 2,85 bilhões para concluir o asfaltamento dos 1.739 quilômetros da BR 163, que liga Cuiabá (MT) a Santarém – o maior município do oeste do Pará, localizado na foz do Tapajós.
No rastro das hidrelétricas, também está prevista a construção de eclusas que possibilitarão a integração do rio Teles Pires, no Mato Grosso, com o rio Tapajós, no Pará. Além dessa hidrovia, o transporte de commodities por via fluvial também será impulsionado pela instalação de ao menos três portos no município de Itaituba, além da expansão das docas de Santarém. Ambientalistas e ativistas de movimentos sociais preocupam-se com os impactos socioambientais que a explosão do agronegócio pode trazer para o oeste do Pará.

GARIMPOS
Quando a produção do mítico garimpo de Serra Pelada, localizado no sudeste do Pará, entrou em declínio, no início dos anos 1980, os aventureiros dispostos a encarar a lama e a malária apostaram que o novo eldorado encontrava-se no Tapajós. E eles estavam certos.
Passadas três décadas, calcula-se que hoje existam nada menos que 2 mil pontos de garimpo no entorno do rio. Para chegar até as chamadas “currutelas”, povoados que funcionam como uma espécie de QG para os quase 50 mil homens decididos a desafiar a floresta, só fretando um pequeno avião ou encarando dias no lombo de uma lancha, a partir de Itaituba.
“Cerca de 98% dos garimpos da região são irregulares”, assegura Oldair Lamarque, engenheiro que chefia o escritório do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em Itaituba. Não é muito difícil entender por que a esmagadora maioria está na clandestinidade. Para fazer o licenciamento ambiental de uma pequena lavra, do tamanho de até 50 campos de futebol, é preciso viajar até a capital Belém, pagar cerca de R$ 16 mil em taxas e ainda arcar com os custos de transporte dos técnicos da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará (Sema).
Sem qualquer tipo de fiscalização, os garimpos são um dos principais vetores de degradação ambiental na bacia do Tapajós. E os problemas não se resumem à contaminação da água por conta da utilização de substâncias tóxicas para depurar o ouro, como o mercúrio e – mais recentemente – o cianeto. Novas técnicas têm aumentado a produtividade e potencializado os impactos sobre a floresta. A utilização de retroescavadeiras chamadas de PCs, usadas para revolver o solo à procura do ouro, é uma delas. O serviço que antes demorava quase um mês para ser feito hoje é realizado em apenas dez dias.
Além disso, aumentou significativamente o número de barcaças que garimpam diretamente o leito do rio Tapajós. Nesse caso, servidores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) entendem que a decisão do governo de reduzir a área de cinco reservas ambientais para a construção das hidrelétricas de Jatobá e São Luiz do Tapajós, em janeiro deste ano, contribuiu para agravar o problema. Sem essa medida, o licenciamento ambiental das usinas não poderia ser feito.
Como parte das áreas foi desprotegida, o número de barcaças no rio cresceu de forma preocupante: pulou de cinco para 35 no trecho de 400 quilômetros entre os municípios de Itaituba e Jacareacanga. “Para desarticular garimpos grandes, como os que existem em Itaituba, é preciso montar praticamente uma operação de guerra”, afirma Nilton Rascon, analista ambiental do ICMBio.
No começo de novembro, fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai), escoltados por duas centenas de agentes da Polícia Federal (PF) e da Força Nacional de Segurança Pública transportados até por helicópteros, resolveram fazer uma batida digna de cinema para desarticular um garimpo que funcionava na Terra Indígena Kayabi, já na divisa entre Pará e Mato Grosso e habitada por indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaká. A operação, no entanto, extrapolou o objetivo inicial de desmantelar a extração de ouro, e seu saldo foi desastroso: casas na aldeia arrombadas, embarcações de pesca afundadas a tiro e, o mais grave, um indígena, Adenilson Kirixi, encontrado morto, boiando no rio.
É fato que o garimpo funcionava com consentimento dos indígenas – que alegam ter protocolado informações a respeito da atividade junto à Funai, a fim de formalizar o acordo de parceria que mantinham com os garimpeiros. Numa região completamente negligenciada pelo poder público, os indígenas afirmam que o pedágio pago pelos mineradores era a única fonte de renda de que dispunham para bancar a eletricidade na aldeia e arcar com os custos das crianças que estudam na sede do município de Jacareacanga. Além disso, vendiam parte de sua produção de alimentos aos garimpeiros.
Segundo lideranças ouvidas pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), desde 2005, os indígenas vêm tentando dialogar com representantes do poder público no sentido de criar projetos de piscicultura, produção de mel e artesanato de forma a reduzir a dependência do garimpo. Mas, por enquanto, nada saiu do papel.
Ainda na avaliação das lideranças ouvidas pelo Cimi, a ação da PF foi calculada para intimidar e fragilizar financeiramente os indígenas, de modo a deixá-los mais “sensíveis” às obras das hidrelétricas na região. Até o presente momento, a PF não se pronunciou sobre o caso, mas abriu um inquérito para investigar o episódio, o qual também é acompanhado pela Funai, o Ibama e a Secretaria-Geral da Presidência da República. O Ministério Público Federal (MPF) também abriu investigação.
Questionada pela Pública, a assessoria de imprensa da Funai respondeu por meio de nota que o órgão “tinha conhecimento de que existia atividade ilícita (garimpo) na Terra Indígena Kayabi. No entanto, não conhecia os detalhes de sua operacionalização e dimensão”. A nota acrescenta que “a Funai não tem o poder de autorizar, formalizar acordos ou dar anuência a qualquer atividade ilegal realizada em terra indígena. Além disso, o garimpo em terra indígena depende de regulamentação pelo Congresso Nacional”.

MINERADORAS
Se o Tapajós é uma das maiores províncias auríferas do mundo, por que ainda não há mineradoras na região? A resposta se divide, basicamente, em duas explicações. A primeira é geológica. “Aqui não existem depósitos grandes, como ocorre em Goiás ou em Minas Gerais. Os depósitos são pequenos e espalhados. Isso favorece o garimpo manual, e não as grandes mineradoras”, explica Lamarque, do DNPM. A segunda explicação é de ordem estritamente econômica. “A falta de estradas e de fontes de energia inviabiliza grandes projetos de mineração de ouro”, completa.
A construção das hidrelétricas e o asfaltamento da BR 163 já estão despertando a sanha das mineradoras. Por enquanto, o ouro do Tapajós ainda não entrou na mira das companhias consideradas majors – as maiores do mundo. Mas pelo menos cinco empresas identificadas como juniors, como são chamadas as de médio porte, já estão em fase de pesquisa. O mais adiantado deles é o Projeto Tocantinzinho, no município de Itaituba, que já está em fase de licenciamento ambiental e deve entrar em funcionamento até 2016. O empreendimento é de uma subsidiária da Eldorado Gold, do Canadá, que já opera uma mina no Amapá.
E não é apenas o ouro que chama atenção no Tapajós. A gigante Anglo American, uma das dez maiores mineradoras do mundo, com lucro líquido da ordem de US$ 6,17 bilhões em 2011, está levantando o potencial de uma jazida de cobre na Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim – a segunda maior do país, com uma área de 1,3 milhão de hectares, quase dez vezes superior à da cidade de São Paulo. Mas é importante ressalvar que, geologicamente falando, o cobre muitas vezes aparece associado ao ouro. Em outras palavras, a mineradora deve mapear todo o potencial da área.
O perímetro de pesquisa requerida pela companhia inglesa ao DNPM, no segundo semestre de 2011, abrange mais da metade da Flona. Em tese, isso não é ilegal: a legislação ambiental permite a mineração em uma reserva desse tipo – desde que devidamente licenciada e adequada ao plano de manejo.
Porém, sem qualquer tipo de autorização, a Anglo American já vem utilizando máquinas de sondagem na área, desde julho deste ano, pelo menos. A denúncia é feita pelo próprio chefe da Flona do Jamanxim, Haroldo Marques. “Esse pedido para realização de sondagem na área tem que ser formalizado. Eu sou o responsável pelo parecer que autoriza pesquisas e perfurações, mas até agora não chegou nada até mim”, explica o servidor do ICMBio. “Eu vi funcionários em caminhonetes com logotipo da Anglo American, usando uniformes, sem qualquer preocupação em esconder o nome da empresa.”
O chefe da Flona do Jamanxim fica lotado no escritório do ICMBio de Itaituba e precisa de autorização dos superiores de Brasília para ir a campo e fiscalizar o cumprimento da legislação ambiental. “Eu estava na fiscalização combatendo o desmatamento, pedi a renovação de diárias, mas ela não foi concedida”, explica Marques. “Fui tirado da fiscalização e parei os trabalhos que estava fazendo por lá. Muito esquisito, né?”
Questionada pela Pública, a assessoria de imprensa da Anglo American emitiu nota em que “confirma que empresa requereu áreas junto ao DNPM” e diz que “aguarda a publicação dos respectivos alvarás de pesquisa, para, só então, solicitar a autorização do ICMBio, órgão gestor das Unidades de Conservação no país, e seu respectivo enquadramento no Plano de Manejo [da Flona do Jamanxim]”. A empresa nega, porém, que esteja fazendo trabalhos de sondagem. “A equipe de campo promoveu no período unicamente contatos com superficiários, visando futura celebração de Termos de Acordo, conforme previsto no Código de Mineração”, finaliza a nota.
Os “superficiários” citados na nota da Anglo American são pessoas que reivindicam a propriedade de terras dentro da Flona do Jamanxim. Quando foi criada, em 2006, a unidade de conservação que leva o nome desse afluente do Tapajós já estava ocupada por diversas fazendas. A pecuária, o garimpo e a extração ilegal de madeira fazem dessa a reserva a que mais perdeu mata nativa em todo país, ao longo de 2012.
Curiosamente, a devastação cresce na mesma velocidade que a intenção do governo de reduzir a área da Flona do Jamanxim. Atualmente, um grupo de trabalho do ICMBio de Brasília analisa a possibilidade de extirpar, no mínimo, 200 mil hectares da área atualmente protegida.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que rastreia o desmatamento por satélite, a floresta perdeu, em 2012, 5.069 hectares até outubro. No mesmo período do ano passado, o número era consideravelmente menor: 972 hectares. “A área onde a Anglo American está fazendo as pesquisas é uma das mais preservadas da Flona”, analisa Marques.

CORREDOR DO AGRONEGÓCIO
Itaguaí Mendes da Silva já não descarta um conflito sangrento na pequena comunidade de Açaizal, localizada a 40 quilômetros do centro de Santarém, o maior município do Tapajós, com 300 mil habitantes. Até dez anos atrás, além de plantar a própria roça e tirar peixe do igarapé que banha o povoado, as 54 famílias – descendentes de indígenas e nordestinos – também arrumavam trabalho como vaqueiros ou capinadores de pasto nas fazendas de gado que circundavam Açaizal.
Porém, desde a chegada dos “gaúchos”, como são apelidados os produtores de grãos que compraram as terras dos criadores de bois a partir de 2001, a relação com os novos vizinhos nunca foi tão tensa. “Nós estamos cercados pela soja”, desespera-se Itaguaí. “A gente não pode nem mais criar galinha. Antes os animais ficavam livres. Agora, não dá para soltar. Se soltar, e eles forem para a área dos gaúchos, morrem.”
Itaguaí também reclama do assoreamento e da contaminação com agrotóxicos dos igarapés onde a comunidade pesca. Por essa razão, os moradores de Açaizal lutam, desde 2004, para que o governo federal reconheça a comunidade como uma terra indígena e retire os sojeiros da área. “Esperamos que em 2013 saia pelo menos uma audiência pública”, afirma.
Os “gaúchos” do oeste paraense não vêm apenas do Rio Grande do Sul. “Muitos são ex-funcionários de grandes fazendas do Mato Grosso, atraídos pelas terras baratas da região”, explica Gílson Rego, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Os preços baixos se justificam pela completa ausência de títulos de propriedade regularizados.
“Dez anos atrás, a terra não valia nada aqui. Eram R$ 250 o hectare [equivalente a um campo de futebol, aproximadamente]. Hoje, já está bem mais valorizado, na casa de R$ 5 mil o hectare”, afirma Toni Silver, coordenador da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa). Mesmo assim, o preço é ainda muito baixo quando comparado aos locais onde mais se produzem grãos no país: em Sinop (MT), o mesmo pedaço de terra não é vendido a menos de R$ 21 mil, segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agrícola (Imea).
No oeste paraense, as fazendas de soja cresceram em torno do porto da multinacional Cargill instalado na foz do rio Tapajós, em Santarém, e se concentram na zona rural desse município e na do vizinho Belterra. Como a falta de títulos regularizados inviabiliza a obtenção de crédito em bancos públicos, a trading norteamericana, uma das maiores comerciantes de commodities agrícolas do mundo, é a principal fonte de financiamento dos produtores. “Existem 170 produtores cadastrados na Cargill”, afirma Silver.
Quem chega pela BR 163 a Santarém depara-se ao longo da estrada com alguns silos e armazéns para estocagem não só de soja, mas também de milho e arroz. Porém, a realidade é que as lavouras de grãos ocupam uma área ainda pouco expressiva, que não chega a 60 mil hectares. “Esse é o tamanho de uma única propriedade comum no Mato Grosso”, compara o coordenador da Faepa.
Mais do que uma fronteira para produção, o Tapajós é visto principalmente como um corredor para escoar a produção do Mato Grosso. Além da BR 163, que deve ser completamente asfaltada até 2014, o governo também planeja aproveitar as hidrelétricas para construir eclusas que podem viabilizar uma hidrovia ligando o rio Teles Pires, no Mato Grosso, ao Tapajós.
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) até chegou a promover uma licitação para encomendar o projeto técnico da hidrovia. Porém, nenhuma empresa se interessou pelos R$ 14 milhões oferecidos para o trabalho, o que levou o órgão federal a suspender o edital. Mas há quem duvide da obra, pelo menos, para o curto prazo. A desconfiança vem da simples observação da história: as eclusas da hidrelétrica de Tucuruí, no rio Tocantins, ficaram prontas 26 anos após a inauguração da usina.
A ideia da hidrovia é ligar o norte do Mato Grosso ao município de Santarém, onde as embarcações saem do Tapajós, adentram o rio Amazonas e da lá ganham o mundo pelo Atlântico. No porto da Cargill localizado em Santarém, cerca de 95% da carga movimentada vêm do Mato Grosso. Mas, por enquanto, os grãos são primeiro transportados de caminhão até Rondônia e, de lá, seguem em barcaças pelo rio Madeira até o rio Amazonas, que recebe o seu afluente Tapajós em Santarém. No terminal da multinacional norteamericana, são carregados os porões de navios capazes de transportar até 60 mil toneladas de grãos.
O porto fluvial da Cargill foi objeto de intensos questionamentos por parte de ambientalistas e movimentos sociais nos últimos anos. Com o consentimento do governo do Pará, a empresa iniciou a operação do terminal sem a realização prévia do Estudo de Impacto Ambiental/ Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) – requisito básico previsto na legislação para licenciar qualquer grande empreendimento. “O porto foi construído em cima de sítios arqueológicos importantes. Além disso, acabou privatizando a praia de Vera Paz, que era muito utilizada pela população de Santarém”, conta Érina Gomes, advogada da ONG Terra de Direitos.
Segundo o diretor de portos da Cargill, Clythio Buggenhout, a empresa construiu o seu terminal depois de vencer em 1999 uma licitação aberta pela Companhia de Docas do Pará (CDP), vinculada à Secretaria de Portos da Presidência da República. De acordo com ele, a área gerida pela CDP já era uma zona portuária consolidada e tinha licença operacional para diversas atividades.
“Foi feita uma consulta à Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará (Sema-PA) e, como o porto já estava licenciado, ela informou que bastaria fazer um Plano de Controle Ambiental (PCA)”, explica Buggenhout, que, antes de assumir o cargo na Cargill, presidiu a CDP entre 2007 e 2009. De acordo com o executivo, até o começo da década passada, não era comum que se cobrasse a realização de um EIA/Rima para licenciar um terminal portuário. “Hoje a gente entende que todo mundo tem que fazer EIA/Rima para qualquer terminal. Mas, na época, era atípico.”
Por meio de nota, a assessoria de imprensa da Cargill respondeu a questionamentos da Pública. Clique aqui para ler a íntegra das respostas.
As justificativas da Cargill não convenceram o MPF, que se baseou sobretudo na Resolução 237, de 1997, publicada dois anos antes da licitação vencida pela Cargill, para cobrar a realização do EIA/Rima. Depois de um longo questionamento judicial promovido pelo MPF, que até obteve liminares para paralisar temporariamente as atividades do porto, a Cargill foi obrigada a fazer o estudo.
A primeira versão foi concluída em 2008 – cinco anos após a inauguração do terminal fluvial. Porém, a Sema-PA exigiu que o trabalho fosse refeito e que se ampliasse a área de influência do empreendimento, para que fossem analisados os impactos socioambientais trazidos pela inevitável expansão do cultivo da soja no oeste paraense, impulsionada pelo porto. A segunda versão do EIA/Rima ficou pronta em 2010.
Porém, o imbróglio está longe de chegar ao fim: a CPEA (Consultoria, Planejamento e Estudos Ambientais), empresa contratada pela Cargill para fazer o estudo de impacto ambiental, é acusada de fraude pelo MPE-PA. Na ação movida pelo órgão estadual, a CPEA é acusada de ter inserido “informações parcialmente incongruentes, as quais apontam desconformidades entre os textos utilizados como pilares para a construção dos argumentos favoráveis ao Licenciamento Ambiental da empresa Cargill S.A. e os resultados dos próprios autores quanto às suas conclusões”.
Dentre os dados supostamente distorcidos pela CPEA, por exemplo, encontram-se estatísticas sobre o desmatamento na zona rural de Santarém, que teriam sido adulteradas de forma a não serem diretamente correlacionadas à instalação do porto da Cargill. Entidades que trabalham em parceria com movimentos sociais e populações tradicionais também acusam o EIA/Rima de não levar em consideração os problemas sofridos por algumas comunidades do Planalto Santareno descendentes de indígenas e de quilombolas, impactadas diretamente pelo plantio e pelo transporte da soja, como se verifica no povoado de Açaizal.
O representante da Cargill nega que a empresa esteja fomentando a violação de direitos de comunidades tradicionais. “A Funai nunca nos oficiou, dizendo que estamos comprando indevidamente de alguma fazenda em área indígena”, argumenta Buggenhout. Ele também afirma que, para a empresa, a produção de soja no oeste do Pará, “comercialmente, é irrisória”. “Se toda a região de Santarém for plantada com soja, e não é isso que a gente quer, ainda assim não seria significativo no movimento do terminal, que já se movimenta – 95% – com carga vinda do Mato Grosso.”
Em entrevista concedida à Pública por e-mail, o diretor-presidente da CPEA, Sérgio Luis Pompeia, refuta as acusações do MPE-PA e afirma que “não houve qualquer dado distorcido sobre o desmatamento nas áreas de influência do empreendimento”. Além disso, diz ele, “as áreas indígenas e de quilombolas existentes na área de influência indireta do empreendimento foram todas relacionadas e analisadas dentro do diagnóstico do EIA/Rima”. Pompeia argumenta ainda que a ação movida pelo MPE-PA “decorreu de um equívoco na análise do EIA realizada por seus assistentes técnicos”. O processo judicial ainda está longe de ter um desfecho: a primeira audiência está marcada para agosto de 2013.
Apesar das desconfianças em relação ao EIA/Rima, o fato é que a Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Pará concedeu, em agosto deste ano, a licença operacional para funcionamento do terminal e, de quebra, também aprovou a licença de instalação para que a infraestrutura do porto seja expandida. “Muitas empresas do agronegócio estavam esperando resolver esse caso da Cargill. Já temos notícias de que outras querem construir portos no Tapajós”, explica Érina.
A menina dos olhos das grandes empresas do agronegócio – e também do setor de transporte de cargas – é o distrito de Miritituba, localizado na margem direita do rio Tapajós, no município de Itaituba. Trata-se de um ponto logístico estratégico não só pela via fluvial, mas também pelo modal rodoviário. É precisamente do lado direito do rio, na altura de Miritituba, que se encontram tanto a BR 163, que liga Cuiabá (MT) a Santarém, como as vias de acesso à rodovia Transamazônica, que rasga a Amazônia de leste a oeste.
Em Miritituba, barcaças de pequeno porte serão carregadas sobretudo com grãos e vão seguir viagem pelo Tapajós e pelo rio Amazonas até outros portos fluviais de maior envergadura, como os dos municípios de Santarém, Barcarena (próximo à capital paraense) e Santana, no entorno de Macapá (AP). “Mas não são apenas grãos que vão ser escoados. Produtos da Zona Franca de Manaus (AM) também devem chegar à região Centro-Oeste a partir de Miritituba”, analisa Buggenhout.
Além da própria Cargill, pelo menos três grandes empresas já compraram terrenos em Miritituba, nos últimos dois anos, para a construção de novos terminais. Uma delas é a também norte-americana Bunge, que figura entre as quatro maiores empresas mundiais do agronegócio e que já está com o processo de licenciamento ambiental do porto em fase avançada. As outras duas são a Hidrovias do Brasil (HB), pertencente ao fundo de investimento P2 Brasil, e a Cianport – empresa ligada a grandes produtores de grãos do Mato Grosso interessados em fazer a logística da sua produção por conta própria. Mas há quem diga que o número de novos portos possa ser até duas vezes maior.
Exageros e especulações à parte, não há como negar que o Tapajós é a bola da vez na expansão da fronteira amazônica – processo que, historicamente, deixou feridas não cicatrizadas devido à lógica predatória com que se instalou em outras partes da floresta. Resta torcer para que a história não se repita no oeste do Pará. Mas, pelo andar da carruagem, a torcida terá de ser grande. Muito grande.

Carta da jovem e guerreira Rosenilda Boro Munduruku, da Aldeia Teles Pires/PA

Qual a mensagem do Povo Munduruku para o mundo?

Nós Munduruku estamos muito ameaçados pelos projetos do governo como barragens, créditos de carbono e demais. O Governo do Brasil está construindo estes projetos para destruir a população indígena e não indígena, construindo estes projetos sem consultar os que moram dentro da área. Hoje o próprio governo está liberando dinheiro, mandando seus soldados matar os inocentes, invadindo suas casas, mas o Governo não está liberando dinheiro para melhorar a sapude, a educação que é prioridade para nós.

Nós, povo Mundurku, não queremos que o governo se decida por si, por que é por causa de nós que o governo está hoje, mas o governo está em nossas mãos nas eleições, por que nós depende um do outro.

Queremos viver de paz, nas nossas terras, nós também temos nossos projetos, construidor, mas não destruido. Preservamos nossa natureza por nós memos, pelos nossos filhos e netos.

Eles também precisam respirar bem, comer bem, conhecer seus lugares sagrados, ter suas culturas, costumes, e viver na paz.

*Rosenilda Boro Munduruku

BRASIL DEVASTAÇÃO E RESISTÊNCIA NA TRANSAMAZÔNICA

Terras indígenas, unidades de conservação ambiental, projetos de assentamento: a sanha das motosserras não vê fronteiras. Reportagem da Caros Amigos viu de perto como atuam ilegalmente as madeireiras que assolam o oeste do Pará
Por Sue Branford

Da florada da andiroba à melhor forma de extrair o óleo de copaíba. Quem ouve Miguel Padre falar diria que o jovem tem suas raízes em algum beiradão amazônico, onde aprendeu a conhecer a floresta e seus frutos. Seu conhecimento, porém, vem de um aprendizado recente, realizado por opção – uma opção coletiva e arriscada. Miguel Padre faz parte de um grupo de colonos que, em meio à intensa operação ilegal de madeireiras na Transamazônica, decidiu seguir outro rumo, fechando seus lotes ao assédio das motosserras e apostando nos recursos da floresta em pé para a manutenção de suas famílias. “Na minha área, não mexeram com a madeira, não. Está tudo lá”, garante o colono.
Não é verdade. Mas Miguel Padre ainda não sabe disso. Enquanto se aplicava ao curso técnico para extrativismo na cidade de Uruará (PA), onde concedeu a entrevista, seu lote de reforma agrária era trespassado por máquinas de madeireiros, que saqueavam suas árvores no Projeto de Assentamento Rio Trairão. Quem lhe dá a notícia, alguns dias mais tarde, é a própria reportagem de Caros Amigos, que visitara o lote de Miguel após a entrevista e ali descobrira o rastro do roubo: toras e mais toras abatidas. “Não, no meu lote, não, não é possível”, lamenta. Denunciar o roubo a alguma instância oficial sequer é cogitado pelo extrativista, cuja primeira reação é chamar um tio seu para ajudá-lo a enfrentar os madeireiros.
O que ocorreu no lote de Miguel Padre compõe uma anedota extremamente emblemática da atuação de madeireiros ilegais na região da Transamazônica. Convencer – por sedução ou coerção – colonos a venderem a madeira de seus lotes, ou, quando isso não funciona, passar ao roubo propriamente dito faz parte do modus operandi, mas este não para por aí. O esgotamento da madeira nobre a leste e, mais recentemente, em porções do oeste do estado de Pará, tem levado as madeireiras a avançar sobre áreas de uso comum de projetos de assentamento, unidades de conservação ambiental e terras indígenas.
As grandes somas envolvidas na atividade resultam em uma rede criminosa com poder de influência no jogo político da região. Há quem resista, seja denunciando a ilegalidade como um todo, seja como Miguel Padre, afirmando sua oposição nos limites de seu próprio lote. A esses, frequentemente desassistidos em sua denúncia pelos órgãos da administração competentes, restam o terror e a violência. Durante um mês, a reportagem de Caros Amigos percorreu a rodovia Transamazônica entre os municípios de Rurópolis e Anapu, onde registrou flagrantes como os de Miguel Padre e outros.

Leia a reportagem completa AQUI

Fonte: Caros Amigos

Munduruku e Tapajós: Quem defende um, Luta pelo outro!

Participe da campanha lançada pelo Fórum da Amazônia Oriental (FAOR), a ASW, O Comitê Metropolitano Xingu Vivo e a Associação Munduruku do Alto Tapajós - PUSURU em apoio ao povo Munduruku e do Rio Tapajós, ambos ameaçados pelo Complexo hidrelétrico do Tapajós.
Compartilhe as imagens, manifeste seu apoio à essa luta.









No twitter use #Munduruku&Tapajós e #SouMunduruku e participe da campanha!

CEKAY GO BARRAGENS!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

BELO MONTE: Justiça ordena à Norte Energia que use dados do MPF no cadastro de atingidos de Belo Monte

A Justiça Federal concedeu liminar ao Ministério Público Federal e ordenou à Norte Energia que faça, dentro de 60 dias, o cadastro de moradores atingidos por Belo Monte no núcleo urbano de Altamira de acordo com os dados apurados pelo MPF em estudo independente. O relatório independente, feito por meio de cooperação técnica com a UFPA, aponta erros de cálculo no Estudo de Impacto Ambiental usado pelos empreendedores.
De acordo com o estudo do MPF, o número de pessoas deslocadas na cidade de Altamira pelo alagamento que a usina vai causar pode ser bem maior que o previsto pelos empreendedores e se eles usarem os dados incorretos para indenizações e reassentamentos, podem deixar milhares de moradores de Altamira sem compensação ou mitigação, conforme exige a licença ambiental.
A juíza federal Carina Cátia Bastos de Senna, concordou que se confirmado o erro do Estudo de Impacto, pode haver prejuízo grave à população. “O início do cumprimento dessa condicionante (o cadastro dos atingidos), baseado no estudo realizado pela empresa trará graves consequências às populações não contempladas na cota 100, pois a diferença é considerável, eis que mais de 9 mil moradores não serão inseridos na denominada cota 100, ficando desprotegidos”, diz na liminar.
Em caso de descumprimento da decisão pela Norte Energia, a Justiça arbitrou multa diária de R$ 10 mil. O processo tramita com o número 0002708-66.2012.4.01.3903

Entenda o caso
A medição independente da cota 100 foi solicitada pelo MPF em 2010 depois de reclamações da população de Altamira, que não tinha acesso a informações claras sobre os deslocamentos e indenizações. Foram dois anos de estudos até que a conclusão da UFPA fosse entregue, demonstrando o subdimensionamento do número de atingidos, causado em parte por imprecisão nos marcos geodésicos utilizados como base para o trabalho, em parte pelo uso de dados populacionais desatualizados.
O MPF prevê que mais de 25 mil pessoas podem ser deslocadas, 9 mil a mais do que o previsto no Estudo de Impactos. O número pode ser muito maior se forem levados em contas os dados mais atualizados, depois do fluxo migratório acarretado pelas obras da própria usina. O MPF lembra à Justiça que “todos os grandes barramentos na Amazônia atingiram famílias que vieram a conhecer que estavam nessa condição apenas quando seus imóveis ficaram submersos”.



As informações são do MPF

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Impactos socioambientais de hidrelétricas na Amazônia são ignorados, diz estudo

Allan Walbert - Portal EBC

Hidrelétrica de Tucuruí, obra iniciada em 1975 no rio Tocantins, foi finalizada depois de 30 anos e custou cerca de 15 bilhões de dólares. Valor foi dez vezes mais do que o previsto inicialmente (Paulo Santos/2002/Amazônia Sob Pressão)
A crescente demanda por energia dos países amazônicos e a falta de planejamento nas políticas públicas têm ignorado os impactos socioambientais derivados da instalação de hidrelétricas na Amazônia. A afirmação é do atlas Amazônia Sob Pressão, divulgado pela Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (Raisg), segundo a qual essa situação crítica causa alterações nos regimes hídricos, diversidade hidrobiológica, contamina as águas e acelera o desmatamento.
O estudo levantou que a Amazônia possui atualmente 417 hidrelétricas. Dessas, 171 estão em operação ou construção, sendo 120 com capacidade menor que 30 megawatts – as chamadas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH). As construções com capacidade de geração maior que 30 megawatts são chamadas de Usinas Hidrelétricas (UHE), que somam 67 unidades em fase de planejamento. Dessas, 13 com supercapacidade maior que 300 megawatts serão construídas no Brasil.
Considerando todos os tipos de hidrelétricas, o Brasil apresenta 340 unidades, o que corresponde a 81,5% do total da região. 109 estão em operação/construção e 231 estão no papel. A macro-bacia do Rio Amazonas (Médio-Baixo) lidera o ranking de instalação dos empreendimentos. Se todas as unidades saírem do papel, o número de PCHs vai ser multiplicado por 1,49 e o de UHEs por 1,31.
Não obstante o atlas apontar como críticas as taxas de crescimento das hidrelétricas, evidencia com gravidade o fato de várias delas estarem total ou parcialmente em Áreas Naturais de Proteção (ANPs). Em 2010, das 171 unidades que estavam em construção ou funcionamento na Amazônia, 7,6% sobrepunham-se a ANPs. 36 das futuras hidrelétricas também devem funcionar no interior desses pontos de conservação.
Já em relação a territórios indígenas, das 171 hidrelétricas em funcionamento, seis delas disputam espaço com as áreas, o que equivale a 3,5%. Dez futuras hidrelétricas ainda devem se instalar nas proximidades de comunidades povoadas por índios.

Quantidade de hidrelétricas por país na Amazônia
PaísHidrelétricas planejadasHidrelétricas atuaisTotal geral
PCHUHEPCHUHE
Brasil176558722340
Peru2931244
Bolívia131914
Equador1010
Venezuela66
Colômbia11
Guiana Francesa11
Suriname11
Total1796712051417
* Com informações da Raisg

Do EBC

Amazônia Pública: Tapajós em transe

Este vídeo apresenta a segunda reportagem da série Amazônia Pública, sobre o projeto de hidrelétricas no Rio Tapajós: 


Em torno de um dos mais belos rios da Amazônia, o Tapajós, no oeste do Pará, a movimentação do governo federal para construir pelo menos duas usinas hidrelétricas nos próximos anos já começa a impulsionar a mineração, ameaçando um mosaico de áreas protegidas. Em uma região rica em ouro e carente de Estado, o impulso trazido pelas novidades pode ser desastroso. Em meio à falta de diálogo, comunidades indígenas e de ribeirinhos lutam pelo direito de discutir o que será de seu futuro. Numa visita a Juruti, onde atua a multinacional Alcoa, vemos um exemplo das dificuldades no diálogo entre as populações locais e os grandes projetos de desenvolvimento. Completa o quadro o papel que a região pode desempenhar na logística da exportação da produção do agronegócio.

Custos sociais de Belo Monte chegam a R$ 1 bilhão, diz estudo

Os custos sociais da construção da usina de Belo Monte, no Pará, são estimados em cerca de US$ 502,7 milhões, segundo estudo do professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), de São José dos Campos (SP), Wilson Cabral de Sousa Júnior, especialista em análise de impactos ambientais.

A reportagem é de Rafael Sampaio e publicada pelo portal Globo Natureza.

A cifra, que equivale a R$ 1 bilhão em valores atuais, é atribuída no estudo a fatores de degradação que vão ser causados pelas obras, como perda da qualidade da água, da atividade pesqueira tradicional e ornamental, prejuízos com turismo e o custo da emissão de CO2 e de metano na atmosfera.
A pesquisa foi publicada no relatório "O Setor Elétrico Brasileiro e a Sustentabilidade no Século 21: Oportunidades e Desafios", entregue no 6º Encontro do Fórum Amazônia Sustentável, que aconteceu em Belém (PA). O relatório havia sido divulgado inicialmente em novembro, e foi preparado por organizações como o WWF, a ONG International Rivers e o Instituto Socioambiental (ISA), além de pesquisadores de questões ambientais.
A previsão de custo social de Belo Monte, de R$ 1 bilhão, equivale ao gasto total do Ministério da Educação com assistência aos estudantes de universidades federais nos últimos cinco anos, segundo o site da pasta. Entre os fatores avaliados, o que mais pesa é o valor das emissões de carbono, afirmou o professor do ITA em entrevista ao G1. Ele classificou a estimativa como "conservadora", apesar de correta para a pesquisa.
Procurado pelo G1, o consórcio Norte Energia, responsável pela usina, disse desconhecer os parâmetros e métodos usados no estudo. Por isso, a empresa afirmou que não vai comentar seus resultados.
A Norte Energia ressaltou ainda que os investimentos para compensação dos impactos sociais, econômicos e ambientais estimados pela empresa para Belo Monte são da ordem de R$ 3,2 bilhões, incluindo "reforma e ampliação das redes de ensino e de saúde, geração de renda e emprego, regularização fundiária e relocação de famílias", entre outras ações.
A companhia disse ainda que todos os fatores mencionados pelo professor do ITA em seu levantamento foram considerados no dimensionamento dos impactos da usina.

Subestimado
O cálculo de R$ 1 bilhão em custos ambientais está subestimado, aponta o pesquisador do ITA. “Ele está correto para as premissas da análise, porém o custo socioambiental pode ser muito maior a partir de valores que não calculamos", disse. Ele cita a perda de biodiversidade como um dos fatores que não foram incluídos na conta. Outras variáveis que não foram levadas em consideração são os valores da terra inundada e o deslocamento da população local.
Para Sousa Júnior, as medidas de compensação das obras “cobrem parcialmente” os danos que vão ser causados por Belo Monte, e não vão ser suficientes. “Há danos que podem ser irreversíveis, como a perda de habitats aquáticos”, disse.

Sem certezas
Para o diretor do Programa Amazônia da International Rivers, Brent Millikan, a construção de Belo Monte deve ter um custo social grande. "Tem uma série de impactos que essa população pode sofrer. Na realidade a gente não sabe, tem incertezas. Teve muitas dúvidas sobre esta questão na época que estava se discutindo a concessão ou não da licença prévia, ou seja, se o empreendimento tinha viabilidade ambiental ou não", afirma.
Millikan cita a população que está na região da Volta Grande do Rio Xingu, que podem “ficar numa situação muito ruim", na sua avaliação, com um provável desvio do curso do rio. "O rio vai ficar numa seca permanente, 80% do seu fluxo deve ser desviado", afirma.
Questionada, a Norte Energia nega que vá alterar o curso do Rio Xingu, e diz que a “empresa se comprometeu a garantir a vazão indicada nos estudos ambientais para cada período do ano”.

Do IHU

Ministério Público lança ofensiva judicial em favor da saúde indígena

O Ministério Público Federal deflagrou ontem uma ofensiva contra a crise na saúde indígena no País. Uma série de ações judiciais serão propostas ao longo do dia exigindo a adoção de medidas para tentar solucionar problemas como falta de medicamentos, ausência de água potável e transporte adequado para pacientes que vivem nas comunidades.


A reportagem é de Alana Rizzo e Lígia Formenti e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Além de pedidos locais, a Procuradoria Geral da Republica deverá apresentar duas ações contra a União. Uma delas pedindo o atendimento aos índios que vivem em terras em processo de demarcação e outra, garantindo o acesso da população indígena a serviços de saúde de média e alta complexidade.
A estratégia, batizada de Dia D da Saúde Indígena, foi traçada a partir de uma reunião de procuradores da República na 6ª Câmara de Revisão e Coordenação, em novembro. "Relatos dos participantes indicavam a mesma fotografia. Há uma realidade indiscutível, socializada. Os índios estão morrendo não por epidemias, mas por displicência", disse a vice-procuradora geral da República, Deborah Duprat. "Estamos perdendo índios brasileiros por mortes evitáveis e esse é um fenômeno nacional."
A responsabilidade pela coordenação da saúde indígena foi transferida em 2010 da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para uma secretaria criada especialmente para esse fim, vinculada ao Ministério da Saúde. A ideia era integrar o setor ao Sistema Único de Saúde (SUS), garantir autonomia dos distritos sanitários indígenas.
A comunidade indígena aprovou a iniciativa. A nova secretaria representaria a libertação da Funasa, envolvida em uma série de ações de desvios de recursos e acusada de aparelhar as coordenações regionais de saúde.
"Hoje não temos notícias de desvios de recursos. Mas a situação de saúde dos índios está até pior", avalia Deborah.
Segundo os procuradores, faltam médicos, enfermeiros, remédios, caixões; e as ações existentes são padronizadas, descoladas das características regionais. "A única coisa que foi feita até agora foi dar CNPJ para os distritos sanitários, para que eles funcionassem como unidades gestoras. No entanto, não têm servidores e as equipes médicas são contratadas por convênios com ONGs", completa a vice-procuradora. Também há indícios de indicações políticas para as chefias dos distritos.

Déficit
Dados do Censo de 2010 indicam que os domicílios indígenas apresentam os maiores déficits em esgotamento sanitário. Em apenas 2,2% das terras indígenas todas as residências estavam ligadas à rede de esgoto ou fluvial. A mortalidade infantil nas comunidades indígenas é o dobro do restante da população nacional.
Pela legislação, o governo deveria instalar postos de saúde em todas as 4.750 aldeias do País, mas a Secretaria de Saúde Indígena só criou 717. O Ministério Público Federal também questiona a falta de estudos e levantamentos epidemiológicos. "Tem índio hoje tomando ansiolítico", critica Deborah.
Responsável por uma área que abrange 21 municípios no Oeste do Pará, o procurador Felipe Almeida Leite aponta para um problema grave na formação dos profissionais em atuação no campo. Ele cita uma recente queixa de falta de medicamentos. "A análise mostrou que remédios equivalentes estavam lá. Mas profissionais não sabiam que a indicação era a mesma."
Problemas de logística também são corriqueiros. Centros de saúde indígena estavam sem balanças para pesagem de crianças. "Os aparelhos já haviam sido adquiridos. Estavam numa central, parados, porque ninguém havia sido comunicado", afirma Leite.
"O argumento de que os problemas são reflexo da transição não pode mais ser usado. Dois anos é tempo razoável para que situação fosse resolvida, pelo menos em parte", diz a procuradora da República em Imperatriz (MA), Natália Lourenço Soares.
Segundo o Ministério da Saúde, até 2015 serão realizados quatro concursos para substituir 12,9 mil profissionais atualmente contratados por convênios.

De IHU

Diga não à PEC 37: Campanha Brasil Contra a Impunidade


Fonte: ANPR – Associação Nacional dos Procuradores da República
Nesta terça-feira, 11 de dezembro, as associações nacionais representativas dos membros do Ministério Público Brasileiro lançam a campanha nacional “Brasil contra a IMPUNIDADE”. O objetivo é chamar a atenção da sociedade para a gravidade da temerária Proposta de Emenda à Constituição nº 37/2011.
Também chamada de “PEC da Impunidade”, a proposição confere poderes investigativos exclusivos às polícias Civil e Federal na seara criminal, inviabilizando a atuação de outros órgãos do Estado, como o Ministério Público.
Inicialmente a campanha ocorrerá pela internet, por meio das redes sociais, mas a partir do ano que vem outras ações serão realizadas em todo o país, como audiências públicas nos estados e contatos com parlamentares e lideranças políticas.
O lançamento da campanha ocorreu às 9 horas, na sede do Ministério Público Militar (MPM), em Brasília (DF). Na mesma ocasião será realizada entrevista coletiva para a imprensa na qual estarão presentes os presidentes do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG), Oswaldo Trigueiro; da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), César Mattar Jr.; da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Alexandre Camanho; da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Carlos Eduardo de Azevedo Lima; da Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM), Ailton José da Silva; e da Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT), Antonio Marcos Dezan.
Outras entidades de classe que se opõem à PEC da Impunidade participarão do ato, tais como a Federação Nacional dos Agentes de Polícia Federal (Fenapef), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) entre outras.
Parlamentares que são contra a aprovação da proposta também já estão com presença confirmada. Entre eles estão os deputados Alessandro Molon (PR/RJ), Vieira da Cunha (PDT/RS) e Lelo Coimbra (PMDB/ES), bem como os senadores Pedro Taques (PDT/MT) e Randolfe Rodrigues (PSOL/AP).
Confira abaixo 10 motivos para ser contra a PEC da Impunidade:
1. Reduz o número de órgãos para fiscalizar. Além de impedir o Ministério Público, evita que órgãos como a Receita Federal, Controladoria-Geral da União, COAF, Banco Central, Previdência Social, IBAMA, Fiscos e Controladorias Estaduais.
2. Polícias Civis e Federais não têm capacidade operacional nem dispõem de pessoal ou meios materiais para levar adiante todas as notícias de crimes registradas. Dados estatísticos revelam que a maioria dos cidadãos que noticiam ilícitos à Polícia não tem retorno dos boletins de ocorrência que registram, e inúmeros sequer são chamados a depor na fase policial. Percentual significativo dos casos noticiados também jamais é concluído pela Polícia. Relatório do Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (ENASP) aponta, em relação aos homicídios que apenas 5 a 8% das investigações são concluídas.
3. Vai contra as decisões dos Tribunais Superiores, que já garantem a possibilidade de investigação pelo Ministério Público. Em inúmeras ações, o entendimento foi favorável ao poder de investigação. O STF, contudo, iniciou o julgamento de Recurso Extraordinário com repercussão geral para colocar fim à polêmica. Condenações recentes de acusados por corrupção, tortura, violência policial e crimes de extermínio contaram com investigação do MP, nas quais a polícia foi omissa.
4. Gera insegurança jurídica e desorganiza o sistema de investigação criminal, já que permitirá que os réus em inúmeros procedimentos criminais suscitem novos questionamentos processuais sobre supostas nulidades, retardando as investigações e colocando em liberdade responsáveis por crimes graves.
5. Vai na contramão de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, entre eles a Convenção de Palermo (que trata do combate ao crime organizado), a Convenção de Mérida (corrupção), a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, que determinam a ampla participação do Ministério Público nas investigações.
6. Define modelo oposto aos adotados por países desenvolvidos como a Alemanha, a França, a Espanha, Itália e Portugal, onde os atos investigatórios são feitos pela Polícia sob a condução e a orientação do Ministério Público e do Judiciário, sendo suas instruções irrecusáveis. Vale ressaltar que estudos apontam que apenas três países estabelecem sistemas onde a polícia tem a exclusividade da investigação criminal: Quênia, Uganda e Indonésia.
7. Nega alterações previstas no PL que institui o Novo Código do Processo Penal, que regulamenta a investigação criminal como gênero diverso da espécie denominada inquérito policial, e cria a chamada ?investigação defensiva?, a ser realizada por advogado ou defensor público para identificação de fontes de prova em favor da defesa do investigado.
8. Cria um dissenso quanto à sua aprovação dentro da própria polícia; a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) afirmou em nota que ?a despeito de sua condição de policial, manifesta-se contrariamente à PEC em atenção à estrutura interna da polícia federal e aos dados sobre a eficácia do inquérito policial no Brasil, com baixos indicadores de solução de homicídios em diversas metrópoles, que, a seu ver, evidenciam a ineficácia do instrumento, e desautorizam que lhe seja conferida exclusividade?.
9. Obstrui o trabalho cooperativo e integrado dos órgãos de persecução penal; um exemplo é a ENASP, que reuniu esforços de policiais, delegados de polícia e de membros do Ministério Público e do Judiciário, ensejando a propositura de mais de oito mil denúncias, 100 mil inquéritos baixados para diligências e mais de 150 mil movimentações de procedimentos antigos.
10. Tenta esvaziar atribuições constitucionalmente reconhecidas aos membros do Ministério Público e enfraquece o combate à criminalidade; além de ignorar a exaustiva regulação existente no âmbito do Ministério Público para as investigações, não reconhece a atuação de órgãos correicionais (Conselho Superior e Conselho Nacional do Ministério Público), bem como do próprio Judiciário, nem, tampouco, o quanto estabelece o artigo 129 da Constituição.
Serviço:
Lançamento da Campanha “Brasil contra a IMPUNIDADE”
Data: 11/12/2012
Hora: 9 horas
Local: Ministério Público Militar – Setor de Embaixadas Norte, lote 43, Brasília (DF)